Prof. Michel Vicente
Música é uma linguagem presente em todos os manifestos humanos. Rituais de morte, nascimento, festas, entretenimento, religião, inúmeras vertentes e possibilidades despertando emoções, memórias e sentimentos singulares. Ouvir, tocar, cantar e compor música são processos altamente complexos, do ponto de vista cognitivo, e ainda pouco explorados nos moldes das práticas letivas contemporâneas.
Música, Neurociência e aprendizagem, são campos do conhecimento que abarcam linhas consonantes nos processos de pesquisa acadêmica, principalmente no final da década dos anos 2000, e singularmente com o interesse de grande parte dos pesquisadores das temáticas destacadas no processamento cognitivo do fazer, perceber e aprender música. Música, assim como outras linguagens com campo da arte, possuem uma representação neuropsicológica e neuropsicopedagógica extensa, no envolvimento direto nas áreas límbicas, na retenção de signos de áreas associativas secundárias, ao sistema de percepção integrada de confluência cerebral e na ativação de áreas cerebrais terciárias. Após o desenvolvimento e evolução dos exames de imagem funcional, o estudo das estruturas das Funções Musicais Cognitivas foi consolidado, se enquadrando na compreensão dos conjuntos de atividades motoras e cognitivas envolvidas no processamento da música, enfatizando – se na importância da lateralização hemisférica da percepção musical, o que sugere certo grau de independência funcional e anatômica para o processamento dos parâmetros do fazer e ouvir música. Em outras palavras os processamentos cognitivos do fazer e ouvir música são diferentes, associados, mas diferentes.
Ouvir
O neurologista britânico, Oliver Sacks, em seu livro “Alucinações Musicais” e o compositor musical canadense Murray Schafer, apontam como características fundamentais para a compreensão cognitiva da música, a importância de uma escuta ativa. Em outras palavras: saber ouvir. Dentro da sala de aula, a premissa fundamental se enquadra na perspectiva da hipótese de que o(a) professor(a) está desenvolvendo, primeiramente nele(a), uma educação de escuta ativa, ou seja se ele(a) sabe ouvir musicalmente. A afirmação não se refere ao gosto do gênero musical docente, pois é um elemento subjetivo, mas sim da capacidade de identificação de forma, ritmo, melodia, harmonia e sentido da peça musical. A perspectiva da escuta ativa é um dos primeiros pontos para uma análise de um processo de aprendizagem musical, e sua
aproximação neuropsicopedagógica é explicita, principalmente para analises de Função Executiva, Matemática, Linguagem e Comportamento Motor.
Fazer (Tocar/Cantar)
O fazer musical está ligado intrinsicamente na capacidade de compreensão da linguagem da música e seu processo de comunicação, tendo em vista que, seguindo as diretrizes do educador musical inglês Keith Swanwick, no livro “Ensinando Música Musicalmente” a música é uma forma de discurso, uma comunicação, diz algo para alguém. E não importa sua forma ou textura, muito menos se é agradável ao ouvido ou não, pois este é um dos elementos subjetivos da interpretação. O fazer musical é um ato cognitivo complexo, pois envolve diversas áreas encefálicas, e sua ação para o processo de atenção seletiva, inibição cognitiva, controle inibitório, comportamento motor, matemática, são ativados dentro de uma execução musical intencional. Desde um bater de palmas dentro de um pulso regular até uma execução musical complexa, possibilitam grandes atividades cerebrais.
A música não pode ser apenas utilizada de forma passiva dentro do processo de aprendizagem, mas como mecanismo singular para ir além do apoio a outros campos de conhecimento, tendo em vista que as funções cognitivas musicais são consonantes aos de inúmeras áreas do conhecimento como a da língua materna e matemática. O Neuropsicopedagogo Clínico ou Institucional, pode usufruir da música como ferramenta para diversas ações, desde a aproximação afetiva entre o coletivo ou um paciente clínico, ou mesmo nos processos de analise para áreas da linguagem, matemática, comportamento motor e funções executivas. A música é uma linguagem extremamente importante para o desenvolvimento humano e está vinculada as origens sociais de nossa espécie, porém é necessário o refinamento da compreensão das estruturas cognitivas musicais, para que haja uma prática musical escolar efetiva.